7. O profeta do castigo divino de Pedro Almeida Vieira
«Com a publicação do seu segundo romance, O Profeta do Castigo Divino, A venturosa vida de Gabriel Malagrida, o jesuíta que tentou salvar Lisboa do terramoto de 1755, Pedro Almeida Vieira (PAV) estatui-se, no todo actual do romance português, como o mais fiel continuador de Fernando Campos e João Aguiar, o que significa, devido à relativa juventude do autor (n. 1969), que se estatui como a grande revelação do romance histórico português à entrada do século XXI.
PAV mostra-se exímio na narração de ambientes, com um admirável domínio vocabular setecentista, reflectindo uma notória capacidade investigativa, capaz de fazer inveja a não poucos historiadores, sustentando a narrativa num excelente conjunto de fontes coevas, que lhe alimentam a capacidade de efabulação a partir de problematizações histórico-sociais da época. Neste seu segundo romance, PAV apresenta o padre Malagrida como um misto de iluminado, de escolhido de Deus, militante eclesiástico, visionário, profeta do mal, socialmente excêntrico face aos próprios companheiros jesuítas, missionário obstinado, tão fanaticamente crente na missão divina da sua vida que não hesita em usar estratagemas ardilosos (como o das bolas de cera no mar) para exaltação de uma maior santidade pessoal e divina. Acresce um lado milagreiro, que espanta o próprio Diabo, e uam beatice supersticiosa, que atrai o mulherio crédulo de Lisboa e São Luís do Maranhão. Padre Malagrida é assim figurado, na visão ficcional de PAV, como o máximo exemplo da mentalidade evangélica dominante no Portugal de D. João V, em absoluto contraste com a nova mentalidade moderna e europeia elevada a figura de Estado de D. José I (excessivamente caricaturizado no romance, seguindo a tradição positivista oitocentista que identificava D. José com um rei tolo) e Marquês de Pombal, este denominado por Malagrida de Diábolos.
Diferentemente do romance de Luís Rosa, O Profeta do Castigo Divino constitui-se como o romance português que melhor descreve a tensão social entre estes dois «Portugais», finalizando com o auto-de-fé em que padre Malagrida é queimado, em 1761, anunciando a vitória (provisória) do Portugal iluminista.»
Miguel Real, JL nº 916 (9-22 de Novembro de 2005)
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